domingo, 18 de novembro de 2012

E ele valeu cada lágrima *

Cena do filme "O casamento do meu melhor amigo"

* Texto de autoria de uma amiga.

Em homenagem ao grande cara dessa história, real, escrevo esse texto totalmente sóbria. Sim, convenhamos, é muito mais fácil dizer o que sente sob o efeito do álcool. Pra aquelas - algumas ou muitas, não sei - que escrevem sobre, é quase que necessário.

Bem, o homem desse texto é um Homem. Sim, sim, foi uma despedida honrada. Estamos falando de meu colega de universidade, aquele que eu achava legalzinho, mas que quase nunca conversava porque ele era quieto, tinha namorada, trabalhava muito, por isso chegava atrasado. E tinha um fusca. É, acho que só me lembrava dele por ter um fusca que chamava nossa atenção. E ele adorava o carro. Depois, recordo de um e-mail em que convida pra uma despedida, estava partindo pra Londres. Não fui à festa, já não sabia mais do colega.

Enfim, como o mundo gira e eu o acompanho, um certo dia decido ir embora do Paraná. É, encheu. Meu emprego não me dava prazer algum, vivia sérias crises com minha família, o cara que demorou tanto tempo pra fazer com que eu gostasse dele enfim conseguiu, e com tal êxito que, após me conquistar, chutou minha latinha. E lá estava eu, devastada, sem vontade.

Como sou feita de prazos e essa vida que levava já estava fazendo hora extra, mudei. Mas mudei mesmo. Vim pra Europa. É, estudar, trabalhar, saí de lá. E deu certo. E eu até que estava feliz. Mas, como esperado, esse ciclo também estava passando e chegando ao seu limite. Coisas ruins acontecendo, pessoas precisando realmente de mim no Brasil, a crise me expulsando do velho continente. E era hora de voltar. Porém, passagem marcada é lei pra pobre. Sem chance de antecipar, lá iria 100, talvez 200 e tantos euros. Ok, no way. O que fazer? Bem, tenho uma pessoa que ficou de me visitar e tal, o amigo da universidade. É, o amigo calado, que agora era solteiro, que me deu várias dicas pra morar no exterior. Ele. Mas... vem mesmo? A gente mal se fala. Bem, ele diz que vem. Estará fazendo um tour pela Europa e passa um tempo aqui comigo, acho que sete dias. Tudo bem. Pode ser legal.

E esse cara chegou. Ele não era legal, ele era... fantástico. Não, ele não ficou lindo, nem extremamente charmoso, nem nada. Ele estava igual. Só que solteiro, visitando-me, na Europa. Foram alguns dos meus melhores dias aqui. Ele foi gentil, educado, simpático, brincalhão, culto, amoroso, ouvinte, calmo. Nada de sexo. Nada de beijos, nem juras de amor. Não aconteceu nada.

Uau, por que então da despedida, desse texto estar aqui? Bem, como disse desde o começo, o cara merece. Antes da aparição dele, até aqui, no alto dos meus 28 anos, não sabia o que era sorrir com o coração, por e com uma pessoa que faz tanto por você, que chega a fazer por ela. Deve ser a retribuição de energias, não sei que nome dar a isso. Nem ele sabe.

Quase estranhos, começamos a conviver. Ele trabalhava duas horas por dia, pela internet, tempo em que eu ajeitava a casa, fazia qualquer outra coisa. Começamos com as visitas. Levava-o nos lugares que me foram apresentados, já habituais. Mas eles nunca mais seriam os mesmos. Sabe o que é tudo fazer e ter outro sentido? Como ele conseguiu? Sendo gentil, sincero, mas principalmente sendo ele mesmo. Com os dias, fomos nos tornando não só bons amigos e confidentes, mas companheiros. Fomos nos conhecendo de alma, de jeitos, manias, histórias tristes, trágicas, cômicas, de vida.

Passamos a conhecer e a explorar um o mundo do outro. Como ele passou por isso tudo? Como nunca nos falamos tanto e com essa intensidade antes? Onde você estava até agora? Pior. Por que você me faz tão bem? E as coisas foram ficando mais e mais claras. Brincadeiras estúpidas no trem, a felicidade de um pseudo casal que causava inveja nos demais. Frases, como: “viu aquele senhor nos olhando? Fiz questão de continuar falando alto, queria que vissem mesmo nossa felicidade” ou “não parece que vou embora amanhã, tenho a impressão de que fico aqui”.

Eu já sentia saudades. O sexto dia já anunciava meu sofrimento. Afinal, quem ia ler pra mim na praia? Quem ia fazer café e arrumar a mesa exatamente como eu fazia? Arrumar minha cama? Fazer a barba de porta aberta, enquanto aviso que vamos sair tarde de novo? E o nosso sorvete? As apostas? Os golpes de defesa pessoal, que ele fazia questão de me ensinar? Mais que isso. A confiança que conquistei, os beijos no braço, o afago na cabeça, o sorriso com os olhos… a música dele, que por me conhecer, agora, achava que ia gostar e que, por isso, limpava e levava seus fones para que pudesse ouvir, durante o tempo em que ficávamos no metrô. A camiseta que eu escolhi e ele comprou? O chá que aliviava por termos comido besteira, de comum acordo, durante o dia? As constatações no mesmo momento de que alguém pensou algo mal da gente, que cobraram mais caro no restaurante por birra, que íamos sentir falta um do outro. Isso já me matava. Como poderia ter encontrado uma pessoa assim? Um cara que me colocava nas nuvens sem nenhum esforço? Será que eu não vivi nada nessa vida? Sou impressionável? Não… justamente por ele não querer me impressionar, eu ficava atordoada.

No fim de uma das tardes, vendo ele contra o sol, ali tão disponível, chamando-me pra ver qualquer coisa no meio de umas pedras, eu pensava: ele poderia um dia fazer parte da minha vida? Assim, efetivamente? Daria certo? Não. Ele não estava nem disponível, ao menos não pra mim. E nem isso fez com que meu coração parece de ficar leve com a presença dele. Eu não sofri, eu, ainda assim, agradeci por tê-lo ao meu lado ou por tê-lo durante esses dias.

Fomos ao aeroporto, demos um longo abraço e eu chorei. Chorei muito, Chorei durante dias. A falta dele em cada canto da casa, longe dos meus olhos, das escadas que subíamos. Era incrível como estava sofrendo. Cheguei a fazer coisas de gente desesperada: não movi um copo dele, com água, do lugar em que deixou.

Tudo melhorou, claro. Fui me ocupando com outras coisas, mas o buraco ficou. Eu sentia saudades dele todos os dias. Escrevi, mandei um mail, falando tudo, ou quase tudo, que ele tinha me causado, todo o bem que me fez. Como não seria diferente, ele mostrou-se lisonjeado, agradeceu da forma não mais carinhosa, mas da forma mais bonita que ele sabia. E o que eu sentia. E agora?

Uma coisa eu omiti. Já que falamos de coisas que não têm muita explicação, mais uma amostra. Quando o deixei no aeroporto, fui até a minha universidade. Sim, chorando muito, lagos, mas eu achava pior ir pra casa. Meio perdida, saí pelo lado errado do metrô. Estava ouvindo música no meu MP3 e, nesse momento, na saída equivocada, deparo-me com o seu avião, levantando voo. Ao mesmo tempo, um refrão alto nos meus ouvidos, gritado: LEAVE. Foi aí que solucei: pôxa, precisava desse fim apoteótico? Pra quê?! Cristo, meu coração parecia que ia explodir. O recado foi dado. Mas, depois, contraditoriamente eu pensava: eu sou tão mais forte! Deixei, queria mesmo sentir aquilo, precisava deixá-lo ir, em todos os sentidos.

Foram dias extraordinários, mas ele não me quis, não na minha totalidade. E eu tinha de respeitar ou insistir na esperança. Não, não preciso disso. Hoje, quase dois meses da partida dele, ainda sorrio sozinha com a passagem de qualquer coisa que me atravesse a lembrança, assim, correndinho.

Há dias em que acordo pensando nele: no que está fazendo, se está ou não feliz. Falamos às vezes e ele ainda me arranca sorrisos. E alguns suspiros. Mas, sabe, ele está lá, num lugar tranquilo, guardado no meu coração, intocável, meio que puro, e eu quero que ele permaneça lá, pra sempre.

Quero que conte comigo, que, alguma vez ou outra, possa sorrir lembrando de qualquer coisa que fizemos juntos. Gostaria de um dia ter a sorte de arrancar qualquer pensamento dele, do tipo: E se? Mas não conto com isso. Vai, querido, vai ser feliz. E obrigada por ter me dado a chance de saber que posso ser feliz com alguém, de verdade, tanto, ou mais, quanto fui com você. 


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