Cena do filme "O casamento do meu melhor amigo"
* Texto de autoria de uma amiga.
Em homenagem ao grande cara dessa
história, real, escrevo esse texto totalmente sóbria. Sim, convenhamos, é muito
mais fácil dizer o que sente sob o efeito do álcool. Pra aquelas - algumas ou
muitas, não sei - que escrevem sobre, é quase que necessário.
Bem, o homem desse texto é um
Homem. Sim, sim, foi uma despedida honrada. Estamos falando de meu colega de
universidade, aquele que eu achava legalzinho, mas que quase nunca conversava
porque ele era quieto, tinha namorada, trabalhava muito, por isso chegava
atrasado. E tinha um fusca. É, acho que só me lembrava dele por ter um fusca
que chamava nossa atenção. E ele adorava o carro. Depois, recordo de um e-mail
em que convida pra uma despedida, estava partindo pra Londres. Não fui à festa,
já não sabia mais do colega.
Enfim, como o mundo gira e eu o
acompanho, um certo dia decido ir embora do Paraná. É, encheu. Meu emprego não
me dava prazer algum, vivia sérias crises com minha família, o cara que demorou
tanto tempo pra fazer com que eu gostasse dele enfim conseguiu, e com tal êxito
que, após me conquistar, chutou minha latinha. E lá estava eu, devastada, sem
vontade.
Como sou feita de prazos e essa
vida que levava já estava fazendo hora extra, mudei. Mas mudei mesmo. Vim pra
Europa. É, estudar, trabalhar, saí de lá. E deu certo. E eu até que estava
feliz. Mas, como esperado, esse ciclo também estava passando e chegando ao seu
limite. Coisas ruins acontecendo, pessoas precisando realmente de mim no
Brasil, a crise me expulsando do velho continente. E era hora de voltar. Porém,
passagem marcada é lei pra pobre. Sem chance de antecipar, lá iria 100, talvez
200 e tantos euros. Ok, no way. O que
fazer? Bem, tenho uma pessoa que ficou de me visitar e tal, o amigo da
universidade. É, o amigo calado, que agora era solteiro, que me deu várias
dicas pra morar no exterior. Ele. Mas... vem mesmo? A gente mal se fala. Bem,
ele diz que vem. Estará fazendo um tour
pela Europa e passa um tempo aqui comigo, acho que sete dias. Tudo bem. Pode
ser legal.
E esse cara chegou. Ele não era
legal, ele era... fantástico. Não, ele não ficou lindo, nem extremamente
charmoso, nem nada. Ele estava igual. Só que solteiro, visitando-me, na Europa.
Foram alguns dos meus melhores dias aqui. Ele foi gentil, educado, simpático,
brincalhão, culto, amoroso, ouvinte, calmo. Nada de sexo. Nada de beijos, nem
juras de amor. Não aconteceu nada.
Uau, por que então da despedida,
desse texto estar aqui? Bem, como disse desde o começo, o cara merece. Antes da
aparição dele, até aqui, no alto dos meus 28 anos, não sabia o que era sorrir
com o coração, por e com uma pessoa que faz tanto por você, que chega a fazer
por ela. Deve ser a retribuição de energias, não sei que nome dar a isso. Nem
ele sabe.
Quase estranhos, começamos a
conviver. Ele trabalhava duas horas por dia, pela internet, tempo em que eu
ajeitava a casa, fazia qualquer outra coisa. Começamos com as visitas. Levava-o
nos lugares que me foram apresentados, já habituais. Mas eles nunca mais seriam
os mesmos. Sabe o que é tudo fazer e ter outro sentido? Como ele conseguiu?
Sendo gentil, sincero, mas principalmente sendo ele mesmo. Com os dias, fomos
nos tornando não só bons amigos e confidentes, mas companheiros. Fomos nos
conhecendo de alma, de jeitos, manias, histórias tristes, trágicas, cômicas, de
vida.
Passamos a conhecer e a explorar
um o mundo do outro. Como ele passou por isso tudo? Como nunca nos falamos
tanto e com essa intensidade antes? Onde você estava até agora? Pior. Por que
você me faz tão bem? E as coisas foram ficando mais e mais claras. Brincadeiras
estúpidas no trem, a felicidade de um pseudo casal que causava inveja nos
demais. Frases, como: “viu aquele senhor nos olhando? Fiz questão de continuar
falando alto, queria que vissem mesmo nossa felicidade” ou “não parece que vou
embora amanhã, tenho a impressão de que fico aqui”.
Eu já sentia saudades. O sexto
dia já anunciava meu sofrimento. Afinal, quem ia ler pra mim na praia? Quem ia
fazer café e arrumar a mesa exatamente como eu fazia? Arrumar minha cama? Fazer
a barba de porta aberta, enquanto aviso que vamos sair tarde de novo? E o nosso
sorvete? As apostas? Os golpes de defesa pessoal, que ele fazia questão de me
ensinar? Mais que isso. A confiança que conquistei, os beijos no braço, o afago
na cabeça, o sorriso com os olhos… a música dele, que por me conhecer, agora,
achava que ia gostar e que, por isso, limpava e levava seus fones para que
pudesse ouvir, durante o tempo em que ficávamos no metrô. A camiseta que eu
escolhi e ele comprou? O chá que aliviava por termos comido besteira, de comum
acordo, durante o dia? As constatações no mesmo momento de que alguém pensou
algo mal da gente, que cobraram mais caro no restaurante por birra, que íamos
sentir falta um do outro. Isso já me matava. Como poderia ter encontrado uma
pessoa assim? Um cara que me colocava nas nuvens sem nenhum esforço? Será que
eu não vivi nada nessa vida? Sou impressionável? Não… justamente por ele não
querer me impressionar, eu ficava atordoada.
No fim de uma das tardes, vendo
ele contra o sol, ali tão disponível, chamando-me pra ver qualquer coisa no
meio de umas pedras, eu pensava: ele poderia um dia fazer parte da minha vida?
Assim, efetivamente? Daria certo? Não. Ele não estava nem disponível, ao menos
não pra mim. E nem isso fez com que meu coração parece de ficar leve com a
presença dele. Eu não sofri, eu, ainda assim, agradeci por tê-lo ao meu lado ou
por tê-lo durante esses dias.
Fomos ao aeroporto, demos um
longo abraço e eu chorei. Chorei muito, Chorei durante dias. A falta dele em
cada canto da casa, longe dos meus olhos, das escadas que subíamos. Era
incrível como estava sofrendo. Cheguei a fazer coisas de gente desesperada: não
movi um copo dele, com água, do lugar em que deixou.
Tudo melhorou, claro. Fui me
ocupando com outras coisas, mas o buraco ficou. Eu sentia saudades dele todos
os dias. Escrevi, mandei um mail, falando tudo, ou quase tudo, que ele tinha me
causado, todo o bem que me fez. Como não seria diferente, ele mostrou-se
lisonjeado, agradeceu da forma não mais carinhosa, mas da forma mais bonita que
ele sabia. E o que eu sentia. E agora?
Uma coisa eu omiti. Já que
falamos de coisas que não têm muita explicação, mais uma amostra. Quando o
deixei no aeroporto, fui até a minha universidade. Sim, chorando muito, lagos,
mas eu achava pior ir pra casa. Meio perdida, saí pelo lado errado do metrô.
Estava ouvindo música no meu MP3 e, nesse momento, na saída equivocada,
deparo-me com o seu avião, levantando voo. Ao mesmo tempo, um refrão alto nos
meus ouvidos, gritado: LEAVE. Foi aí
que solucei: pôxa, precisava desse fim apoteótico? Pra quê?! Cristo, meu
coração parecia que ia explodir. O recado foi dado. Mas, depois,
contraditoriamente eu pensava: eu sou tão mais forte! Deixei, queria mesmo
sentir aquilo, precisava deixá-lo ir, em todos os sentidos.
Foram dias extraordinários, mas
ele não me quis, não na minha totalidade. E eu tinha de respeitar ou insistir
na esperança. Não, não preciso disso. Hoje, quase dois meses da partida dele,
ainda sorrio sozinha com a passagem de qualquer coisa que me atravesse a lembrança,
assim, correndinho.
Há dias em que acordo pensando
nele: no que está fazendo, se está ou não feliz. Falamos às vezes e ele ainda
me arranca sorrisos. E alguns suspiros. Mas, sabe, ele está lá, num lugar
tranquilo, guardado no meu coração, intocável, meio que puro, e eu quero que
ele permaneça lá, pra sempre.
Quero que conte comigo, que,
alguma vez ou outra, possa sorrir lembrando de qualquer coisa que fizemos
juntos. Gostaria de um dia ter a sorte de arrancar qualquer pensamento dele, do
tipo: E se? Mas não conto com isso. Vai, querido, vai ser feliz. E obrigada por
ter me dado a chance de saber que posso ser feliz com alguém, de verdade,
tanto, ou mais, quanto fui com você.
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